É interessante pensar que muitas pessoas que vão ler esse artigo têm deficiência visual. Eles usarão para ler esse artigo ferramentas de leitura para acessibilidade, que possuímos instalados em nossos computadores e celulares. Segundo o censo do IBGE de 2010, a deficiência visual severa atingia 6,6 milhões de brasileiros de diferentes idades, sendo que meio milhão de pessoas são cegas, ou seja, 0,3% dos brasileiros. A todas essas pessoas a tecnologia tem um papel importante ao acesso a informação e a melhoria da qualidade de vida, pois a inserem em um vasto mundo de informação.
No dia a dia, os olhos de um cego são os dedos de suas mãos. Os olhos de um cego tambem são seus ouvidos. Tambem é a sua bengala. Os olhos de um cego são os olhos de um ser humano que está a seu lado ou de um cão guia treinado para isso e que o acompanha. Quando perdemos um sentido, passamos a usar mais os outros e, por ser necessário, aguçamos os sentidos que nos restaram. O tato é desenvolvido com o passar dos dias e o cego passa a reconhecer muito bem formatos, objeto e tudo mais que pode ser tateado, tudo que pode pegar com a mão.
Imagine então que pessoas com deficiência visual pudessem ver as imagens de suas viagens, suas fotos e momentos registrados! Tenho um amigo que me disse que cegos costumam tirar fotos para registrar momentos, principalmente para guardar essas lembranças e mostrar para seus amigos íntimos e familiares. A Empresa 3D Pirate fez um experimento onde imprime algumas fotos de pessoas cegas e as faz sentir suas fotos através do tato. Eles transformaram fotos normais em objetos tridimensionais e os imprimiram em uma impressora 3D. Esse experimento nos faz imaginar que poderá ser possível fazer imagens 3D com nossas câmeras e celulares em um futuro próximo e isso permitirá que façamos álbuns de lembranças em 3D! Nao é incrivel?
Abaixo coloquei um vídeo dessa iniciativa. Vou descrever o vídeo para aqueles que não conseguem ver e estão lendo esse texto através de um interpretador.
O video começa com um primeiro homem que não possui visão em uma sala lendo em braile. Mostra em seguida um segundo homem tambem com deficiência visual tocando violão, sentado em um sofá. Então mostra um terceiro homem, um senhor também com deficiência tateando fotos. Esse senhor aparece andando com um cão guia e então ele é mostrado em uma sala e diz em inglês: “As vezes você pode tirar uma foto, dobrá-la, levá-la com você, mas o filme é um pouco diferente porque não consegue tocá-la.” Aparecem os dizeres no video: Memórias Tocantes. Volta ao vídeo o jovem do violão, ele se chama Mario e esta pegando metro. Ele diz em italiano: “Me chamo Mario, sou italiano, de uma cidade chamada Pinerolo dos PreAlpes. Eu perdi minha visão por conta de uma doença chamada glaucoma”. O terceiro homem volta a aparecer em outra cena, onde abre uma maleta. Ele volta a falar: “Eu era diretor de fotografia. Perdi minha visão há aproximadamente 12 anos atrás”. Uma mulher aparentando 35 anos aparece no vídeo, cenas de criança e de uma mãe com dois filhos aparece, um deles de colo e uma criança que aparenta ter uns 10 anos. Ela diz em inglês: “As memórias para mim são quase como sonho. São como um fantasma ao vento. Estão lá e já se foram, mas você pode tê-las para sempre”. Uma senhora que não tem deficiência aparece no video ajudando uma mulher a tatear uma foto. Ela diz em espanhol: “Aqui está você com apenas três anos. Ponha a mão sobre a foto para que se lembre que tinha uma boneca.”. Uma moca que está tateando diz: “Sim, Sim, Sim…”. O primeiro homem volta ao video. Ele esta andando pela rua com seu guia. Ele diz: “Meu pai me fez me sentir como o garoto mais feliz do mundo”. O diretor volta ao video, cena de um filme na Bolívia com pessoal local de lá aparece. Ele fala: “Dois anos atrás eu fui pra Bolívia para filmar um curta. Estava trabalhando de novo como diretor de fotografia, mesmo sem enxergar. Essa foto foi capturada de uma cena desse filme. Eu sei todos esse detalhes em minha mente, mas eu os consigo ver”. O jovem que tocava violão no começo do video volta a aparecer, tocando na rua, em um local que parece ser o metro. “A capa de meu álbum é uma fotografia musical de dois a três anos de minha vida. Foi projetada por uma amiga intima minha como uma descrição de quem eu sou”. Uma jovem com deficiência visual é mostrada em um quarto tateando fotos. Dezenas de fotos são mostradas no video. Ela diz em espanhol: “Para mim uma recordação é algo que guardamos que com certeza com o tempo se vai desfazendo aos poucos. É muito importante retomar as lembranças para saber tudo que passamos pela vida”. A primeira mulher volta ao video, em uma sala de estar, sentada em um sofá na penumbra, e diz: “A presença de minha familia, a lembrança da neve, foi perfeito. Se eu pudesse tocar a foto, eu poderia fazer a MINHA lembrança real novamente”. E então é mostrada a impressão em plástico das cenas de fotos em imagens 3D, feitas por uma impressora 3D da companhia que teve essa ideia e fez o filme.
As peças impresssas mostradas são as seguintes:
1. Um pai joga o filho para o ar e seu cabelo está esvoaçante.
2. Uma família está esquiando: O pai, a mãe, e os dois filhos, todos com roupas e equipamentos para neve. A mãe está atras da criança maior e o pai ao lado esquerdo da mãe, a frente da criança menor.
3. Duas pessoas com chapéu cônico aparecem com mãos dadas, um maior que outro.
4. Uma cena dentro de um cômodo é impressa, com uma mesa ao fundo da sala, um boliviano vestido com roupas tipicas sentado em uma cadeira e tambem algumas cadeiras vazias. Existem alguns detalhes, como algo em cima da mesa e uma mesinha à esquerda da pessoa que está sentada com algo grande em cima da mesa.
5. Uma peça complexa, parecendo ser 2 anjos, que reproduz a capa do disco de Mario.
As cinco pecas são entregues às pessoas que aparecem no video, cada uma recebe uma peca diferente. Todos eles sorriem.
Mario diz com a peca 5 em suas mãos: “Minha nossa, eu sempre quis que isso acontecesse! Com isso finalmente posso vê-la”. A primeira mulher diz com a peça na mão: “E eu posso me ver finalmente na foto. Eu nunca pude me ver na foto!” A jovem com a peça número 3 na mão diz: “Ela tem sua mão assim… como sua cara assim”. E ela sorri. O primeiro homem volta a cena com a peça número 1 em suas mãos. Ele diz: “Meu pai morreu quando eu tinha cinco ou seis anos”. A primeira mulher diz: “Eu me lembro desse chapéu”. Em seguida ela sorri de satisfação e alegria. O diretor, com a peça número 4 em mãos diz: “Tinha uma mesa ao fundo. Sim, aqui esta ela!” A segunda mulher volta e diz: “Nós estamos nos dando as mãos. Eu não sabia!” Com a peça do filho sendo jogado para cima, o primeiro homem diz: “Ele costumava me jogar para o ar e dizia meu querido filho!” O diretor aparece no video com a peça de uma cena de seu filme em maos e fala: “É incrível porque não basta uma hora para entender um desenho desse tipo.” A tecnologia é apenas uma ferramenta. As pessoas dão a ela uma proposta.
Bom, se você se arrepiou com o video, você pensa como eu.
Atualmente muitas peças para impressão 3D podem ser baixadas de sites como thinkverse e impressas para que a pessoa com deficiência visual tenha noção exata do que é determinado objeto na vida real, ou seja, ela poderia ser utilizada para prover acessibilidade.
“Havendo acessibilidade, humanidade, eu digo que um cego vê tudo mais, o mundo não e só o que se vê”
Projetos como esse nos inspiram a inovar para o bem.
Referências
Parabéns ao artigo de Gilmar de Freitas Mariano entitulado “Como o cego vê” que me inspirou fazer esse artigo e que retirei parte do texto. http://intervox.nce.ufrj.br/~gilmar/cegove.html
Uma grande referência e inspiração para esse artigo foi o site do 3D Pirate. Eles são fabricantes de impressoras 3D e tiveram essa excelente iniciativa.
Outro site que usei como referência foi: http://www.dailydot.com/technology/3d-printer-helps-blind-see/